terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Volta em banco

Meu encontro com o grafite vem se rarefazendo ultimamente. Me restrinjo agora a corridas-de-escrita dentro do molde dissertativo-argumentativo (molde esse que é mais uma receita de bolo - competitiva, visto que se dá melhor quem a prepara em menos tempo - do que livre exercício de opinião) e garatujas envolvendo algarismos indo-arábicos em suas relações operacionais.

O que me traz aqui, então? O ócio. Impedido de exercer as atividades já descritas, que agora se encontram como minhas prioritárias, e me sentindo demasiado impedido de usufruir de um de meus desejos maiores (ler, seria ele), volto a exercer minha função (por mim mesmo incubida a mim) de por mente (parte dela, claro; infinito universo!) em pó-de-carbono.

Jazo há cerca de duas horas em local mesmo e posição. Acredito que tal permanência deve-se prioritariamente a dois fatos: o hábito já recorrente de pagamento de salários no início do mês e a ineficiência dos bancos públicos para lidar com demanda tão alta. Poderia citar como causa também o atendimento prioritário aos ingressos à melhoridade, mas temo arrepender-me daqui a quarenta anos.

Lembro-me de como era minha vida antes daqui. Aproveitava-a com entes queridos, além, é claro, de arcar com os compromissos estudantis. Mas não mais agora. Poderia dizer que minha vida mudou após essas duas horas e onze minutos de espera. A análise dessas cem pessoas que por aqui circularam certamente trouxeram uma experiência nova para mim. Tão envoltas em seus cotidianos, despender tamanha parte de precioso tepo vital já faz parte deles. Unidades de tempo vão sendo gastas não só com a espera no banco, mas também com o pagamento de contas, o trânsito nas rotas trabalho-casa e casa-trabalho, e com a fila do pão.

E é nessa vida que eu me adentro. Sem perceber, caminho não só para a especificação dos estudos, mas também rumo a todas as rotinas típicas de quem já soma uma quantidade considerável de primaveras. O que fica, além do suspiro desiludido e meio que conformado, é o questionamento:

Serei como eles, que de tão absortos nos mundos próprios isolam-se e despercebem o redor?

Não sei. E não posso aprofundar mais. Minha senha foi chamada.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Closer to the sky


Favor ouvir enquanto lê.

-

Tinha como hábito os banhos regados a música. Geralmente dançava, ou apreciava estaticamente, encaixava-se com o ritmo. Mas naquele banho estava envolto nas situações cotidianas. Dinheiro, horário, entre outros. Cabelo, partes do corpo; xampu sabonete: tudo era feito maquinalmente, entre comentários mentais em relação à temperatura da água e o sol no ambiente.

E foi maquinalmente que o viu. Ali, voando, se aproximando, jazia o mosquito. Localizou-o, focalizou-o, tentou envolvê-lo com a palma. Pegá-lo enquanto no ar, ao invés de esperá-lo parar em alguma superfície. Era também um de seus hábitos. Fazia-o rapidamente, mas não tão rapidamente quanto deveria ser.

Escapou. Viu-o subindo, indo em direção ao teto. Um tanto alto para a baixa estatura do garoto. Não teve dúvidas: pulou. E foi nesse momento, que, somado ao entrave entre homem e inseto, veio o som. A música! Nelly Furtado, com o seu sotaque canadense, proferia as seguintes palavras: "Mais perto do céu". Sim, em bom português. E de Portugal.

E foi assim que estava. E foi assim que se viu. Enquanto no ar, sua mente foi rápida o bastante para, ao mesmo tempo, tentar agarrar o pequeno animal e refletir sobre o som que vibrava seus tímpanos e os seguintes ossículos. Estava, realmente, mais perto do céu. Assim se via. E a poética do verso, do momento, dominava-o! Não conseguiu obter o inseto na primeira vez. Pulou novamente, mas pulou mais alto. E assim seguiu. Mal seus pés tocavam o chão, e já de lá saíam com impulso e força renovados. De que importavam as poucas horas de sono? Nelly dizia "Como uma força/ como uma força/ como uma força que ninguém pode parar".

E assim continuou. Naquela aventura particular e minúscula, sem quaisquer grandes consequências para a humanidade, o garoto se mantinha. E Nelly o ajudava. Dava-lhe força!
Pulava alto, mais alto do que jamais o fizera. Alcançou o céu. O teto, no caso. A cada tentativa, localizava novamente o mosquito em voo desorientado. Até que não o achou mais.

Parou de pular. Agora parado, estático em seu lugar, olhou para o punho fechado. Abriu-o. E lá jazia o pequeno voador, inerte. Triste, sim, mas pior seria uma transmissão de dengue. Além do mais, mosquito tem vida curta.

E foi assim que o garoto se sentiu forte. Ainda que uma força utilizada sem fins significativos, foi uma força que ninguém pôde parar.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Talvez não tão estranho assim.

Talvez eu possa dizer o que primeiramente me chamou a atenção. Na época, quando despertei meu interesse, foi por causa da originalidade da história, em meu julgamento. Na época, também, não refleti muito sobre tal constatação. Talvez uns dois anos separem o momento em que tomei conhecimento do filme e eu assistindo-o de fato. Pouco sabia eu que seria o tempo necessário para inteiramente sentir a película.

E qual a importância desse período? Meu maior envolvimento com a escrita, acredito eu. Acho que é por isso que Mais estranho que a ficcção para muitos não vai muito longe. Mas uma vez nessa angústia que é escrever, uma vez que você percebe o quão visionário foi o criador do filme ao elaborar uma história sobre alguém que não é só personagem de um livro, mas também da vida, percebe-se, inclusive, o valor da obra. Não duvido que essa ideia já seja antiga (visto que boa parte dos casos de metalinguagem já fazem parte de grandes livros, se não todos) e eu não a conheça, bebê (a)literato que sou.

E pode-se incluir a questão pessoal. Que autor não gostaria de ter a chance de interagir diretamente com o seu personagem? Mais que isso, ver que ele tem autonomia?

Talvez sem um grande orçamento. Talvez sem uma excelente trilha sonora. Talvez sem inesquecíveis atuações. Talvez um dos poucos filmes sérios de Will Farrell. Talvez nem mesmo o enredo seja lá grande coisa. Talvez apenas mais um filme lançado no mundo. Outro detalhe jogado. Mas é como foi dito:

"[...] we must remember that all these things, the nuances, the anomalies, the subtleties which we assume only accessorise our days are, in fact, here for a much larger and nobler cause:

They are here to save our lives."

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Rapaz,

mil perdões, sei que isso está entregue às aranhas.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Why doesn't it always rain on me?

Eu falei com a chuva. Veio a mim sem eu sequer chamá-la, mas como foi bem-vinda! Quem sabe ela tornasse minhas lágrimas camufladas. Como a quis! Pedi-a com mais força. Pingos grossos! Daqueles que se fazem perfeitamente audíveis ao tocar o chão.

Eu falei com a chuva, e ela não me atendeu. Fez-se garoa. Mas era de força que eu precisava. Um toró traria à tona todo aquele sofrimento guardado pelas convenções sociais, que só de cutucar já dói o corpo todo.

Mas ela queria me ver sofrer. Não a culpo; nada que eu não merecesse. E a ela isso disse. Que fosse feita sua vontade. Falei-lhe que entendia seu desejo: que minha dor extravazasse aos poucos, evaporando sem pressa. Nada mais justo. Contei-lhe que a dor da qual eu havia sido agente dela agora sofria. E causada por mim! Nada que ela não soubesse.

Eu falei com a chuva, e ela me ouviu. Vai ver que por pena tratou de ganhar vigor. Que maravilhoso! Senti meu cabelo umedecer, mas não tão rápido quanto desejava. Comentei com ela que bem que podia ser mais. E ela diminuiu. Fui eu ganancioso? Abusivo? Tudo bem, pedi que mantivesse o ritmo de antes. Ela manteve: cessou água. É preciso ser tão exato assim com a natureza?

Eu falei com a chuva, e ela me ouviu. Ouviu, mas não atendeu. Circulei um pouco pela rua, ainda esperançoso. Até que percebi seu jogo. Entendi que, assim que entrasse em casa, ela desabaria. Acreditava que era apenas para me dar o gostinho, e assim aumentar o que eu tava cá dentro. E assim foi.

Até demorou um pouco. Achei estar errado. Mas ela veio: desabou com o que podia. Mas só por provocação: logo se recolheu ao seu nada, e eu ao meu.
Meu nada nunca havia pesado tanto.

domingo, 9 de agosto de 2009

Indagação

Todos os dias, a qualquer momento (seja no primeiro abrir de olhos, seja ao ver a morte pela caixa mágica ou pelo papel, ou até mesmo quando se aprecia a mais saborosa das sobremesas), milhões de pessoas, de tão espalhadas que parecem poucas, fazem-se a mesma pergunta: é para ser assim?

Talvez não.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Falha de comunicação

Posto de beira de estrada. Lojinha de conveniência. Algum lugar no Mato Grosso. Com sede, pergunto:
-Quanto é a latinha de ixpraite?

Duas meninas atendem. Uma delas não resiste, esconde o riso e sai da minha vista. A outra indaga:
-O quê?
-A lata de ixpraite. Quanto é?
A expressão dela seria a mesma se eu tivesse pedido asvujabsrtls. Começo a pensar se não deveria dizer "Quanto éah a latchinha dji ispraitxe?", mas fico com a repetição e passo a gesticular.

-A lata, a lata - simbolizo algo parecido com uma utilizando as mãos - quanto é?

A "sumida" ri mais. Está atrás da parede. Não a vejo, mas sei onde está. Minha vontade é de dizer que isso não se faz, que há vários modos de falar pelo Brasil, que o dela não é o certo, que não há certo, que o meu não é engraçado por ser diferente... mas prefiro desistir.

-Dois reais - a falante finalmente responde.

Pago, pego, espero o troco, tomo. Ou melhor, bebo. O gosto da matogrossense é o mesmo da pernambucana.

domingo, 5 de julho de 2009

Crise de insônia causada por um neoliberal

Talvez eu nunca tenha exposto aqui um texto político. Muito provavelmente, propositalmente. Sinto-me desconfortável ao expor opiniões de tal cunho. Na verdade, sempre acho que nunca tenho argumentos nem formação suficientes para discutir sobre esse assunto. Só que dessa vez o tópico me intrigou...

Sexta-feira. Eu, como um típico terceiranista da área de humanas, havia acabado de ter uma aula de História. O assunto era totalitarismos, Revolução Russa e a crise de 1929. Não sei se isso influencia, mas certamente é um contraponto ao assunto principal.

Por algum motivo, acabei por parar num tópico de orkut que perguntava sobre a legalidade da xerox de livros. Uma das pessoas que respondeu o tópico chamou-me a atenção, e chequei o seu perfil. Mostrava várias imagens comparando os E.U.A. com o Brasil, e outras que, muitas vezes, exaltavam o capitalismo, até o título de "capitalistic pig". Fiquei na dúvida se o determinado sujeito apoiava o regime ou o execrava.

No entanto, seu perfil trazia um link. Era o que eu precisava para definir sua posição política. O endereço trazido era o artigo "Por que a liberdade assusta tanto?", referente à inexigência do diploma para os profissionais da área de jornalismo. O artigo, não só pelo conteúdo, por alguma razão me foi bastante interessante. Por ele, tomei conhecimento do Instituto Ludwig von Mises Brasil, que busca passar adiante uma doutrina econômica da Escola Austríaca, seja lá o que for. O texto e o site mostram claramente a posição neoliberal (e anarquista, de um certo modo) do instituto.

Não vou mentir: entrei em concordância em alguns pontos. Mas outros, provavelmente os princípios básicos da tal escola, me foram extremamente absurdos. Esse trecho, por exemplo: "
Sempre alguns poucos privilegiados irão ganhar em detrimento dos vários outros desafortunados."

Que eu seja revolucionário, socialista, comunista, marxista, hipócrita!, o que for; simplesmente não consigo aceitar que essa frase seja dita livremente. Ratificar que alguns devem se beneficiar às custas de uma maioria...

Mas não é isso que me chama a atenção. Minto: a indignação ao ler trechos como esse é enorme! Tanto que, às 5h30 (3 horas após minha ida à cama), me vieram à mente as palavras de meu professor de História: "uma economia capitalista sem a regulamentação do Estado vai sofrer crises. Por quê? Porque o povo é ganancioso, sempre vai querer obter o máximo possível.", ou algo assim.

Seja o que tenha sido, a minha indignação para com o artigo e um outro motivo pessoal foram o bastante para me acordar (as 5h30!), pensando todas as infinitas possíveis maneiras nas quais o texto fora infeliz. Apareci de pé seis horas mais cedo do que o normal, atitude que fez meus pais, no mínimo, levantarem as respectivas sobrancelhas. Infelizmente, para mim, o tal artigo (entre outros fatores, inclusive relutância ao sono) me fez permanecer com os olhos abertos por praticamente vinte e quatro horas.

Sei que o artigo e o tal instituto não me deixarão tão cedo. Na verdade, até me preocupo com suas ideias! Não minto: acredito ser uma pessoa altamente influenciável, e temo cair pelos seus ideais. Fica em mim a esperança intensa de que isso não aconteça; apesar de permanecer o desejo de conhecer os ideais da Escola Austríaca (muitas vezes, para contrariá-la).

PS: favor perceber que escrevo esse texto vinte e quatro horas após o ocorrido; mal sei como me aguento em pé.

sábado, 20 de junho de 2009

Oxe, menino, parabéns!

Um ano. Mas afinal, o que é o ano. Não falo do sentido literal, a volta no Sol; pergunto sobre o seu significado na vida cotidiana. Simbolicamente, fica como o reinício do ciclo, ou uma nova etapa no caminho (caso se siga uma visão desprovida de novos começos). Passar um ano vem como aquela lembrança de "Caramba! O tempo passou. Vejamos o que fiz..."

E aí se reflete. Tiro hoje como um dia de fechação para balanço. Em um ano, estabeleci metas mais solidamente, fixei um objetivo. E claro, mais fica por vir! Afinal de contas, o passar de ano surge também para lembrar os que ainda vêm.

Tiro hoje também para agradecer. Não só essenciais como entes queridos, mas os de especial contribuição: Tatá, Flávia, Rita e tantos outros, que mesmo inconscientemente me fizeram adentrar no escrito.

E claro, como todo bom ano que passou, tiro hoje para comemorar.
Festejemos, minhas multifacetas camaradas! Pois hoje é um dia de mim para eu.

domingo, 7 de junho de 2009

Exagerando

-Que fome.
-Pois é...
-Queres ir ali? - aponta para uma loja de pastel.
-Tais afim de comer pastel?
-É, tô também não...
-Também?
-É.
-Quando eu disse que eu não queria?
-Quando eu disse que era tu que também não queria?

-
Não se pode exagerar nas inferências.

terça-feira, 2 de junho de 2009

De dentro do monstro de metal que come gente e depois as evacua.

Andar de ônibus hoje em dia no Recife predispõe a existência de algumas coisas. Além das já habituais paciência, calor e medo (seja de assalto ou de coisas como passar o trajeto em pé ao lado de uma agradável axila, ter seu ombro como travesseiro de um desconhecido, entre outros...), surge ainda a necessidade de um pequeno apetrecho tecnológico, composto de uns muitos chips e alguns gigas de memória (e pensar que há poucos anos 256 megabytes era música que não acabava mais). Este, acoplado a um fio que se bifurca em duas extremidades, passou a ser essencial em qualquer viagem no transporte público. Para quantos mundos não se viaja com esses pequenos dispositivos enfiados na orelha! De fato, o escapismo proporcionado é formidável. Combinado a uma janela na sombra e um dia ventoso, então...

Pois é, aparelhos como mp3 ou celulares modernos com tocadores do formato tornaram-se imprescindíveis. Inclusive para mim. Se ônibus é meu lugar de divagações, com uma musiquinha supimpa nem se fala. Talvez assim entedam minha frustração no momento dado.

Encontrava-me eu num Rio Doce/Piedade com mais dois amigos. Os leitores olindenses frequentadores do Shopping Recife de independência o bastante para irem sozinhos mas de idade baixa para dirigir um carro sabem como é gratificante encontrar um Barra de Jangada dando sopa quando se precisa, uma vez que sua probabilidade de aparecer na necessidade é quase nula. Lotado, sim, mas nada melhor do que descer dentro das imediações do centro de compras. Após alguns poucos minutos de conversa, meus dois amigos começam a tirar de seus respectivos bolsos aparelhos executores de mp3. Que ótima ideia!, pensei comigo mesmo alegremente. A alegria se foi ao constatar que meu fone havia ficado em seu lugar de repouso: minha casa. Quando fui informar tal fato aos amigos, já era tarde: ambos estavam embalados em mundos próprios, tornando o fato de estarem em pé "parados" pelos próximos 50 minutos irrelevante. Estavam distantes, logo tudo que eu poderia fazer era ir cutucá-los ou gritar loucamente por eles, mas não sou do tipo que incomoda os demais passageiros.

Felizmente, como um bom incentivador à ideia escrita, surgiu-me, no momento do isolamento em pleno percurso descrito acima, esses parágrafos que aqui estão sendo lidos. Na verdade só as primeiras 20 palavras; tinha em mão apenas o celular, e digitar um texto desses não era exatamente agradável (nem com T9), me levando a escrever o resto posteriormente.

Mas o que realmente me agradou foi o ato generoso. Após um tempo, com a diminuição do contingente populacional no veículo, pude novamente reunir-me com meus amigos. Um deles, bondoso e atencioso como ele só, ofereceu-me um dos fones. Que felicitação! Melhor do que criar todo um universo com a música, é ter alguém com quem compartilhá-lo.

É por essas e outras que continuo amando os ônibus.


segunda-feira, 25 de maio de 2009

Meu irmão.

Uma ligação. Percebi por pouco: com o celular no silencioso, só a constatei porque a tela do aparelho se acendeu.
Marcio Neves.
Por que meu irmão tá me ligando, me perguntei. Ele no momento se encontrava no andar de cima da casa. Atendi.

-Réquiem para um sonho tá passando agora, no Telecine Cult. Acabou de começar. Se quiser gravar...

Ele sabia que eu queria ver o filme.
Meu irmão. Que há uma semana, havia feito um escândalo por causa de sua caixa de som fora de seu computador, retirada por mim, exigindo que a colocasse no seu lugar de origem imediatamente; mas que só efetivamente precisara dela uma semana depois.
Meu irmão. Que usou de todo o tempo do almoço para menosprezar minha escolha de curso universitário, evidenciando a opinião de que, para ele, o dele era superior.

E ainda assim, meu irmão.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Desperdício?

-Tu vai fazer que área?
-Humanas.
-Poxa velho, que desperdício... faça saúde!

A indagação veio de um dos meus professores de Biologia, tendo como alvo minha pessoa. Eis que comecei a pensar:

Desperdício? então todas as pessoas realmente inteligentes estão em saúde? O resto fica para as outras áreas? Literatas, artistas, jornalistas, políticos, advogados, filósofos, sociólogos, são tudo pessoas incapazes de ser o máximo que poderiam?

Longe de mim me comparar a eles, mas e os grandes gênios das ciências humanas e das artes? Filósofos como os iluministas, Marx e Engels, de extrema importância para o desenlace de grandes acontecimentos no mundo... músicos, escritores, pintores e escultores como Villa-Lobos, os Andrades, Tarsila do Amaral, Brecheret, fundamentais para a consolidação de uma identidade nacional... todas as contribuições por eles dadas são desprezíveis comparas às que poderiam ser obtidas caso seguissem um outro caminho? Seria mais útil, então, se virassem médicos?
Era isso o que ele queria dizer?

Pena que só cheguei a essas conclusões três dias depois da pergunta. Sou péssimo para vencer discussões imediatas.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Dezessete anos e meio,

mas quem está contando, não é mesmo?

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Que pele!

Cordialidade. É assim que começa. Na verdade, com uma piadinha.
-Eu já ia embora!
Pois é, tenho hábito de chegar tarde. Desculpei-me, né. Me deitei na mesa, e começou o procedimento. Ela passou uns dos 45978273 cremes conhecidos pelo homem, cada um com uma específica função que ninguém sabe ao certo, mas que no final fazem a mesma coisa: tiram acne.

Quem foi numa limpeza de pele deve saber do que falo. Certamente, uma experiência curiosíssima! A sensação de ardor quando é posta aquela substância que deve ser baseada em eucalipto, menta, enfim, qualquer coisa que se pareça com pasta-de-dente na cara... bom, é uma sensação única, de fato.

Mas nada mais único do que a hora H: espremer.
Aparentemente nada está errado. A dra. (é?) vai apertando aqueles malditos pontos vermelhos, tirando os hospedeiros indesejáveis; você faz uma expressãozinha de repulsa de vez em quando, mas nada muito forte, porque você é macho e não aguentar isso é coisa de menina.

Mas em sua cabeça, aaaah em sua cabeça!

Chegando no nariz, ela diz:
-É, agora vem a pior parte.
-Infelizmente - dou um riso, disfarçando.
Louca! Louca! isso é uma sádica! Torturadora profissional, já trabalhou no exército, aposto! CIA, FBI, que seja, um desses ela fez parte! FILHA DA MÃE DEIXE ESSA QUE TÁ INFLAMADO!
-
Eita, tá inflamado... vai doer, viu?
você jura? Nem tinha sentido! obrigado por avisar, saber que vai ser extremamente dolorido me alegra profundamente!
-
Ih... essa eu tô vendo que vai ser como um filho!
tu jura que tá ajudando, não é? NInguém te ensinou que comentários do tipo "tá quase lá!" são um incentivo! Vai, diz que é como um filho, é exatamente o que eu quero, ter um parto agora!

Pra finalizar o ambiente falta apenas uma daquelas músicas de elevadores, só para aumentar o contraste com a cena na mente. Tudo na aparência de tranquilidade por fora, que belo!

E o pior é que agora depois de tudo não vejo tanta diferença.

domingo, 10 de maio de 2009

The canals of my city

E ao passar pela ponte Limoeiro, a janela do ônibus revela tantas outras pontes espalhadas, e a lua espelhada no Capibaribe. E então, naquele breu da avenida, lembro-me daqueles na rua, no chão, dormindo por ali. Numa contraditória influência do filme que acabo de assistir, em minha cabeça esses versos se formam:

I love my city
Even though it's not perfect

We should love the imperfect
the almost perfect
the perfectless

Cause that's what it takes to make it perfect.

sábado, 2 de maio de 2009

Why so genius?

"Introduce a little anarchy… upset the established order… and everything becomes chaos. I'm an agent of chaos. And you know the thing about chaos? It's fair."

Many questions come up with The Dark Knight. Many lessons of humanity too. Is there someone willing to sacrifice himself for a greater good? If you were to kill someone in order to survive, would you do it? How far does anyone go without trespassing human ethics?

But for some reason, the question that impresses me the most refers to this: geniality and madness. Joker was a freak for everyone, but he was also a genius. He was beyond general understanding.The fact that he could not only see, but understand what other people couldn't doesn't make him a mental, someone inferior. His world wasn't distorted, it only had different concepts from ours. Are our concepts the right ones? The only ones? Aren't there other ways to be followed?

Please note that I don't support his attitudes like killing. What intrigues me is that he had a completely different way of life. He wasn't attached to material stuff nor people. He says he has an objective, but he doesn't know what to do once he reaches it. For me, he's intrigued by the society. He sees us as an outsider. He knows that, somewhere deep into us, he lies. So we suit him as lab rats.

But he's not alone. Representing another side of geniality, we have Batman. Actually, not him exactly; a part only. The part that doesn't think rationally, the one that gives in so people can have hope. That part is not a person at all; it's an agent for an ideology. A part able to destroy itself so things can change. The capacity of seeing and executing such an action... only a genius can make it.

And then, remains the question: does geniality require madness? Before everything, what is madness? Someone who doesn't follow a pattern, the regular way of life. But then again, what makes us sure our regular way of life is the right one?

In my opinion, yes, geniality requires madness. But madness is not necessarily something negative. To be a genius is something so unique that a completely different mind organisation is needed. A different way of seeing the world.

So, who wants to be a genius?

-

Traduzo assim que possível

sábado, 25 de abril de 2009

Cê viu?

se alguém me vir por aí,
favor me devolver
que o que sou me falta

se alguém me vir por aí,
me avisa que eu tô aqui
pra ver se me junto comigo

se alguém me vir por aí
não finge que não conhece
pois foi por fingir que eu quebrei

se alguém me vir por aí
me pegue e não solte
que eu não vou aguentar
ser meio sozinho não

se alguém me viu por aí
sabe que o eu aqui não sou
fui, talvez
mas não mais serei.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

vida atual

Como comentário do texto de Fernanda, minha prima querida, acabei por pôr (esse acento caiu?) em algumas palavras a minha vida no Atual, meu colégio onde estudo há 9 anos. Segue:

Quanto ao colégio, eu entendo também. Eu vivi o Atual. Desde a 3ª série! Por mais que eu tivesse passado a não simpatizar com a administração do colégio, eu sabia que as pessoas de lá eram muito importantes para mim. E eu ainda sei disso! Quero ser o orador da turma, e penso em como vou falar sobre o colégio, todo esse tempo...

Mas a verdade é que, para mim, passou. Não o menosprezo! Reconheço como o colégio foi importante para mim. O que acontece é que, por melhor que seja uma fase, temos que aprender a deixá-la, não é?
E é isso. Eu deixei o Atual. Não largado, indiferente a ele; guardo-o bem. Mas é uma fase, e ela tem que ir. Não vou mentir que não morro de empolgação pela universidade, só que compreendo que a minha vida no colégio não foi só uma pré-vida.

Comigo é assim: nem acabou e eu já quero sair. Ainda tenho o mundo pela frente.

terça-feira, 14 de abril de 2009

O outro lado.

A câmera mostra uma casa. Grande; a família deve ser abastada. Dentro dela não há aparelhos tecnológicos: televisão, DVD, refrigeradores, nada disso. Vê-se uma decoração colorida, viva. Uma grande bandeira do Brasil jaz imponente em uma das paredes. De repente, várias mulheres morenas, de corpos exuberantes, e algumas menininhas também, aparecem trajando pouca roupa bastante colorida, salto alto, purpurina. O que fazem? Sambam. Sambam como se não houvesse qualquer outra ativididade para se fazer. Nada de estudos, profissões; só lhes restam dançar. A cena se repete várias e várias vezes, como se a dança fosse um hábito rotineiro naquela casa.

Pronto: está criada uma novela de como a Índia vê o Brasil.
Ou não. Resta a esperança de que eles vão pesquisar mais sobre nós.
Ou vai ver não façam novela nenhuma mesmo. É melhor.

Ah, a linguagem!

2009 para mim começou mais tarde. E o pior: nem tinha notado isso. Por três meses fiquei vivendo num mesmo clima do ano passado, com os mesmos comportamento e postura de 2008.
Na verdade, dá até para considerar esses meados de março em diante como um 2008 e meio, meio que uma fase de transmissão.

Mas se assim for, o que aconteceu de tão importante em abril para o ano novo ser finalmente declarado? Pois é, foi algo grande. Para mim, claro, confesso ser esse um texto apenas para que fique de registro essa fase atual.

Sabe a sensação de você escolher um curso na universidade por não achar que nada mais lhe serve? É como o último garoto escolhido no jogo de queimado, barra-bandeira, enfim: você não o escolhe porque quer, mas sim porque é a última opção. A diferença é que os demais garotos, no caso cursos, não foram escolhidos, mas sim eliminados; diferentes demais. E é aí que tá: uma coisa é você escolher um curso por ele lhe atrair, apresentar um destaque, outra coisa é você decidir por aquele que menos lhe causa aversão.

Pois é, assim fiquei. Desde 2007. E foram 2,4 longos e relativamente felizes anos com Ciências da Computação. Mas o último ano do Ensino Médio é complicado: você finalmente percebe que o vestibular vai acontecer, e não tem jeito. E aí? Seja o que você decidir, deverá ser algo que, em tese, perdurará por mais no mínimo 4 anos. E então foi que eu pensei: será que aprender cálculo, linguagem de programação e sistemas de informática é o que eu quero pelos próximos 4 anos?

A pergunta perdurou. O curso havia sido uma decisão forte, tivera dois anos para formar alicerces! A pergunta precisou criar igual força. Levou menos tempo, de fato; e foi chegando aos poucos.

A verdade é que a minha maior dificuldade foi exatamente quebrar a certeza de Ciências da computação. Não havia como! Em tempos como vestibular, destruir uma certeza dessas desestrutura você para as demais atividades do ano! E portanto, o processo foi penoso.

Houve brigas comigo mesmo. Reconciliações comigo mesmo e com demais outros. Por mais estranho que seja, o simples fato de dizer em voz alta "Eu vou fazer Letras" mudou totalmente tudo. A simples profissão dessa frase foi capaz de fazer como que a escolha anterior pela Ciência nunca houvesse ocorrido.

Mudei. E nunca me senti tão bem por isso! Uma coisa é escolher um curso por falta de opções, mas outra totalmente diferente é ter realmente uma prefêrencia! E aí surge a pergunta: por que não escolheu antes?!

Medo, claro. Dois dos meus irmãos (os únicos, vale dizer) seguiram pelo caminho exato. Confiança! Se deu certo para eles, daria para mim! Tolice, sim! Mas felizmente percebida antes que fosse preciso esperar o vestibular 2011 para mudá-la.

2009 para mim começou mais tarde.
E para mim ele acabava por aqui mesmo, para que eu finalmente pudesse entrar para a universidade. Mas, first things first!

Bem-vindo, 2009! Que continue a ser um ano de agradáveis mudanças!

domingo, 12 de abril de 2009

Divergência (Ou A curiosidade pela criação das palavras)

Eu: Curtir é um verbo engraçado. Curtir, curta. É como que já estivesse implícito a frase "aproveite porque dura pouco", simplesmente pela semelhança entre o verbo e o adjetivo. Será que um nasceu do outro? Ou surgiram independentes? Se forem independentes, aí sim seria uma coisa linda. Ou vai ver é um pouco diferente, na linha de "tudo o que é bom dura pouco", logo Curtir significa que você tá aproveitando algo necessariamente curto. Ou mais filosófico, que se você curte algo é porque é algo bom, apesar de passar rápido, colocando a felicidade num conceito atemporal. Fui meio redundante, né?

Amigo: não vou ver camelo pra sempre
LIBERDADE!

é, vai ver não fosse uma discussão muito boa.
preciso achar amigos letristas.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Pergunta:

Matemática é uma má temática?

terça-feira, 31 de março de 2009

Dalton

-Zinho?
-Diga, minha filha.

Dolant falava com ele assim. Se é que podia chamar de ele. Se é que podia chamar de alguém! Quem é? Ah, aquele que dizem todo poderoso... Deus, Jeová, Alá, que seja.

-Cê num acha que a vida poderia ser mais do que já é?
-Mais como?
-Ah... além.
-Ora, foi para isso que eu dei às pessoas a capacidade de criar!

Dolant pensou bem muito e teve uma ideia: criou um deus. Não foi fácil, teve que ter muita concentração e desejo. Dizem até que passou anos pensando apenas nisso para consegui-lo! Mas criou. E esse deus foi forte: criou uma vida mais do que já era.

-Zinhoinho?
Era assim que
Dolant chamava o deus dela.
-Sim?
-Meu deus me deu o poder de criar meu deus. E se ele também tivesse sido criado por alguém com o poder de criar um deus?

Zinhoinho não respondeu. Não que fosse incapaz; só não queria dar a
Dolant a resposta.

Mas isso não importava, e
Dolant sabia que não.
O que importava é que ela tinha ido além, e isso fez dela seu próprio deus.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Sabedoria materna.

-PUTAQUEPARIU!

Foi o que se deu para ouvir da sala de estar. Saí após uns instantes do escritório, irritado, rumo à cozinha. Minha mãe indagou:

-Derramou o quê?

Como é?

-Como tu sabe?
-Ouvi um "puta que pariu"...

De fato, suco de cajá se espalhava pela mesa de computador no momento.

Ainda descubro como as mães sabem das coisas.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Criando a consciência da incapacidade de leitura.

Há coisas que deveriam ser ensinadas na escola. São muitas, claro, que deveriam substituir outros assuntos estudados por uma razão inimaginável, como os Princípios da Geografia e os ribossomos. Mas esse em mente específico é bem importante: como ler. Certamente haveria disciplinas básicas anteriores, como o alfabeto, interpretação, fábulas e contos de fadas, e aqueles livros do ginásio que sempre falam de sexo, gravidez e AIDS.

Uma vez transportas essas barreiras, viria a arte (arte?) de uma leitura mais... digamos "avançada". Não desmerecendo as outras; cada fase tem sua importância no momento, por mais que se diga depois que foi fácil (apesar de nunca ter sido). Mas enfim, o que proponho para as aulas é... não sei. Na verdade, seria o aluno mais assíduo! Eis que, há pouco tempo, me encontrava numa fase onde achava que os únicos livros que realmente mereciam serem lidos eram os considerados grandes nomes da Literatura. Nunca o fiz externamente, mas ria por dentro ao ver amigos lendo outros livros que não fosse um "Dom Casmurro" ou um "A Hora da Estrela". Tolo, sei. Quebrei a cara ao achar que leria facilmente livros como "Primeiras Estórias" e "Cartas a um jovem poeta".

Mas tudo bem, uma vez percebido que não se pode ler um conto de Guimarães Rosa em 5 minutos (mesmo tendo ele umas 6 páginas), decidi avançar por uma nova tática: leitura balanceada. Era simples: tudo o que eu precisaria fazer era balancear um livro "pesado" com um livro mais "leve". Decidi ter por leveza um... Verissimo, que tal? O pai, não o filho.

Taí mais uma mancada. Nada contra o autor, pelo contrário! Outro cronista como ele por aí não se vê (eu que não vejo, ok, reconheço minha limitação de autores). O problema foi considerá-lo leve. Primeiro que o livro comprado foi "O mundo é bárbaro e o que nós temos a ver com isso", de alto teor político-econômico-social, numa perfeita dose de ironia cruel. Até aí tudo bem, mas o problema é que o que eu buscava era um livro de cabeceira para os minutos pré-sono.

Grande erro! Ler Verissimo me faz, no apagar das luzes, o exato oposto de apagar os infinitos pontos luminosos da minha mente: parece mais uma explosão de fogos de artíficio chineses, daqueles que até desenho de dragão fazem no céu. Isso sem falar na rave de ideias criadas, que por mais explosivas que sejam no momento, contrariam o próprio princípio de rave: apagam-se com algumas horas de criação. Daí crio meu dilema: passar o papel o que o autor me passou para a cabeça ou garantir a noite de sono e, consequentemente, o dia posterior acordado?

Quantas complicações evitadas simplesmente pela existência de aulas não puramente conteudistas nas escolas!

Só que aí vem a dúvida: seriam esses obstáculos necessários para a construção de um melhor escritor?

Talvez não Freud, mas quem sabe Verissimo explica.

-

Ps: sim, foi o próprio gorducho gaúcho que desencadeou o texto acima.

sábado, 7 de março de 2009

Quando ela sumiu - Parte 3

Zé Ninguém seguiu jornada.
Quanto tempo havia? Não havia ideia. Quanto ao tempo, só lhe angustiava o fato de ele ainda não tê-la visto, depois de tanto.
O lugar de encontro era distante. O caminho, pesaroso. Cansaço não o afetava, no entanto. Um estreito rochoso quase o deixou preso, uma montanha não o derrubou por um triz, um rio por pouco não o afogou.
Chegou a uma praia. Nadou. Nadou tanto que seus dedos se enrugaram, os lábios racharam.
Zé Ninguém agora era magro, pele queimada pela luz diária do sol; barba e cabelos por fazer. Mas ninguém o dizia feio: nada se comparava ao peculiar brilho no olhar.
Nadou. Nadou tanto que chegou numa ilha. Andou até achar uma caverna. Lá luz não adentrava; de lá, luz saía. O que se via era um clarão suave, tal par seu olhar.
Não se falaram. Zé Ninguém ficou lá uma noite-dia. Lembrara-se novamente de como se era após as seis da tarde. Permaneceu ali, calado, ao seu lado. E então a olhou.
Não cegou. Não fechou os olhos. Deixou bem à mostra sua essência.
Abriu-se.
Ela não suportou: emocionou-se. Saiu em disparada de volta ao céu.

Aquele dia acabou por não ser dia, mas noite. O astro sumido parecia querer compensar o tempo perdido; o sol aceitou. Cansado como estava!
Zé Ninguém voltou para sua cidade. Vanglórias! Exceto por Maria Mariana Vacumoutra, agora casada com o delegado Pinhazafado.

A verdade é que não lhe importava. Toda noite ele estava lá, e a Lua estava para ele. Aquele que a salvou de sua solidão. Noite tão irradiante nunca antes existiu; nem como aquela, nem comos as que a seguiram.

domingo, 1 de março de 2009

mãe

a língua é meu instrumento primeiro
seria eu quem, assim, sem ela?
alinguado, desexpressado,
desexpressante,
sem língua sou-me aquilo que não quero ser
sem língua sou-me vácuo.

com ela sou-me o mesmo sem
mas passo a poder ser o que quiser.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

E foi.

Tem um mistério que ninguém solucionou ainda. São muitos, claro, mas esse é um que a explicação em si não é de tanto valor. O que importa é que acontece. Surgiu faz-se é tempo, mas perdura até hoje, a cada dia mais forte.

Chega uma época em que vai dando um rebuliço no povo. Chega assim, aos poucos, só uma vontadezinha ali, um impulsozinho aqui, e por aí vai. Mas o tempo vai passando, e o dia vai chegando, e aí não se aguenta mais;

explode.

E por uns cinco dias a gente fica assim, explodindo, expulsando, exteriorizando toda aquela vontade que por tanto tempo ficou guardada sem ter vez.
Faz-se um acordo oculto, sem precisar de palavra, de contrato. Como se todos tivessem sido criados para esse momento, essa alegria que alcança céu, terra e mar.

E daí se há um mistério quanto a existência? Deixa assim. Ver a razão do carnaval é que nem se perguntar por que a gente respira.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

a verdade é que me preocupa o meu ser. vejo a banalidade e desgosto, a ponto de negá-la em minha vida; enfeito-a de modo a exibi-la como única e relevante. sempre na preocupação de achar a maneira certa de especializar.

e me pergunto, então, se assim é com os outros. se quando eles estão aqui, nesse momento meu, que para eles seria o momento deles, expressam-se de maneira tão bela simplesmente porque deixará bela, pela beleza em si, como se a realidade não lhes fossem apreciável.

que assim não seja. que a beleza não seja uma máscara, mas um traço. e que aqueles, assim como eu, sejam apenas os dispostos a vê-la real, não criada.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Que haja tempo!
Não só para o necessário,
mas praquele outro lado,
que parece que se esqueceu.

para um contato distante,
para a alegria inebriante
para mim,
para eu.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Quando ela sumiu - Parte 2

Foi em busca. Mas para onde? Custava saber onde a Lua se escondia. Fez a única coisa que podia fazer: andou. Olhos nos cantos. Tudo permanecia negro. Vendo que não estava pelos arredores, não deu outro jeito; pegou sua bicicleta em casa e partiu em jornada.

-Cê volta, meu filho?
-Volto, não sei quando.

Preocupação. A mãe não aguentaria, mas teve que aguentar. Saiu da cidade. Pelas casas, só se viam pessoas assustadas, incógnitas expressas em seus rostos. Como todo homem deveria ser, mas não era, saiu perguntando. A maioria era incapaz de dar uma resposta concreta. Abriam a boca, mas nada saía dela. Estavam atônitos.

A noite se rendia ao dia. Zé Ninguém se rendeu ao cansaço e parou numa pousada. Mas só foi dormir depois do dia amanhecer, temendo, quem sabe, que a outra vítima fosse o Sol. Nada feito, a estrela ainda voltou na sua missão de luz. A surpresa, no entanto, veio ao longo do dia. Os mais atentos perceberam uma variação no movimento solar: o dia era, de fato, todo dele agora. A meia-noite virara um outro meio-dia, e as seis horas da tarde era tanto um pôr-do-sol como um nascer do mesmo. O Sol fazia hora extra para suprir a falta da Lua. Como ficava o outro lado do mundo, só os chineses sabem. Vai ver o astro-rei viera ajudar aquele que colocou-se de corpo e tão inteiramente de alma na missão de resgatar a Lua. Zé Ninguém gostava de pensar assim.

Os dias passavam. Mas o aventureiro não era tolo: sabia por onde procurar. Entrou em becos aparentemente desertos, para então descobrir a existência de ocultos que sabiam por onde levá-lo. Diziam eles que a Lua havia vindo como estrela cadente, movendo-se tão rápido que só os mais atentos não fizeram um desejo, vendo que, naquele tamanho todo, estava próximo, se sendo estrela brilharia até a cegueira.

Vinha a sucessão. Um homem de aparência mafiosa o orientara a perguntar a um outro homem de aparência também mafiosa, mas dessa vez careca, que seria encontrado numa cidade vizinha. Esse, por sua vez, dissera que quem relamente sabia de algo era uma galega insinuada, mas era preciso haver cuidado pois ela mentia bastante. A galega, depois de devidamente cuidada para que não mentisse, mandou-o para um homem cujo bigode era de um alvo brilhantíssimo. E assim Zé Ninguém passava pelas pessoas com detalhes que as definiam. Em alguns momentos ele passou por várias enrascadas, sendo confundido com outros ou então simplesmente por desapoio ao rapaz. Mas no fim de cada situação notavam que havia algo de diferente nele, só não sabiam dizer o quê. Notando isso, mandavam-no em frente.

Passou pelos mais diversos lugares. A bicicleta deu lugar a inclusive passagens de avião, recebidas em apostas de jogos bem jogados. Zé Ninguém soube se virar ao longo de sua jornada, mesmo sem ter qualquer experiência prévia. Vai ver estava no sangue. Vai ver estava naquilo que era diferente dele, mas as pessoas não sabiam dizer o quê.

Chegou, então, a alguém de maior importância. A garota dos olhos extremamente azuis. Filha de um homem poderosíssimo, clamava saber a localização da Lua, mas ser incapaz de dizer. Até, no entanto, ver Zé Ninguém. Dizem os presentes no momento que ela chorou ao vê-lo. Não de tristeza, mas da mais pura explosão de felicidade. E ela, ao contrário das demais, foi capaz de dizer não só onde estava a Lua, mas também o que era isso que estava tão diferente nele, mas as pessoas não sabiam dizer o quê: determinação. Sua persistência, sua força de vontade eram tão intensas, e tão puras, que, assim ela colocava, as pessoas eram capazes de senti-la, e até mesmo de cativá-la!

Disse onde ela estava. E, ao desejar a Zé Ninguém boa sorte, sentiu que o fazia de todo o coração.

Agora sabia onde achar a Lua. E seguiu até lá.

sábado, 24 de janeiro de 2009

Quando ela sumiu - Parte 1

O que se via ao longe era o campo de cana-de-açúcar e o céu alaranjado ao fundo. Pôr-do-sol. Esplendorosa visão! Ouviam-se pássaros; os poucos que ainda ousavam cantar com a noite por vir. Só que o sol no momento era mero coadjuvante; prólogo, prévia, teaser. Estava apenas abrindo para a atração principal:

A Lua. Que mais os dois iriam querer ali? Jogavam conversa fora entre um beijo e outro, só na espera. Claro que a cena era inegavelmente belíssima, mas para eles servia só como distração. Aguardavam-na ansiosamente, ainda mais sabendo que seria cheia!

O tempo passava. Saiu laranja, dando lugar a um vago azul puxado para o marinho. Escurecia. Chegou num roxo. Um leve tom avermelhado, ainda que marrom, chegou a manchar o céu. Fora rápido, passou com a nuvem que chegara. O roxo voltara, e logo se ia.

E então enegreceu.

Mas assim, negro? Com Lua? E cheia? Inaceitável!

O azul esperado, daqueles que se acha que já se amanhece quando não passa das sete horas, aquele que se dá com o brilho lunar, não chegou. Passaram-se horas. Nada.

A Lua havia sumido.

Frustração. Mais dele do que dela. A promessa era simples: saia comigo, só para ver a Lua. Mas e cadê ela? A moça se afastou. O rapaz a indagou.

-Sem Lua, nada feito.

Encucou-se. Coçou a cabeça. Esclareceu-se.

-E trazendo-te Lua?
-Aí aceito!

Estava decidido! Ele, Zé Ninguém, de família desimportante, sem grandes feitos, traria a Lua de volta para ter o amor de Maria Mariana Vacumotra! E nada o tiraria de sua jornada.

Nada mesmo. A mãe chamou para o jantar, e quem disse que voltou? O professor ofeceu-lhe bolsa, e nada de regresso! O futuro patrão, então, deu-lhe emprego de bom sustento, mas ele se manteve!

Só tinha cabeça pra Lua mesmo.


sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

?

Quem somos nós realmente?
Mutação ambulante?
Incessante?
Fase de lua?
Roupa do dia?
Vontade de hora?
Impulso de instante?

Somos nós mesmos?
Seríamos os outros?
Seremos quem queremos?
Fomos alguém?
Fomos e não seremos mais?
Seremos mas nunca fomos?

Somos o que queremos?
O que fazemos?
O que sentimos?
Como fazemos?
Como sentimos?
Como queremos?
Tudo?

Nada?
Somos nossa razão?
Somos nosso desejo?
Somos nossos?
Somos?

Será que somos?
Será que sim?
Será que não?
Será que talvez?
Seremos só dúvida?
Se somos?
Se?
?

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Música, windows media player!

O início vem difícil, mas chega. Paciência!

Música. Na verdade, essa é a palavra central do texto; não deveria entrar aqui, no início. Mas tudo bem, comecemos assim.

O fato é que tenho pensado sobre música por agora. Não no geral, nem em relação a eu querer tocar. Mais fácil dizer o que é do que manter-me eliminando alternativas erradas. Me vêm à cabeça músicas que, sabe-se lá motivos, destacam-se para mim quando ouvidas. Tentarei explicá-los.

A primeira aqui não poderia ser outra senão The Scientist - Coldplay. Libertação. Ouvi-a por acaso numa novela há muito tempo, sequer lembro-me qual, talvez O Beijo Do Vampiro. Saí perguntando desesperadamente quem seria o grupo que a cantava, até que o encontrei, junto ao nome. Surgiu aí a minha primeira paixão por uma banda: costumava digitar coldplay no kazaa ou no shareaza e baixava qualquer arquivo de áudio que aparecia. O jeito era esse, uma vez que algo tão útil como a comunidade do orkut Discografias não existia. Mas era bom assim.
A verdade é que The Scientist veio me acompanhando até hoje, já fazendo bem uns cinco ou seis anos. Letra e melodia combinam-se na tentativa de reverter um presente prejudicado, voltando ao passado. É uma música muito forte, ouvi-la sempre me deixa extremamente emocional. Me permite entrar em contato com esse outro lado, sempre que preciso pôr pra fora algum sentimento pesado em excesso. Acho que dá para considerá-la assim: abre a ferida, mas no intuito de liberar o veneno.

Eis que me deparo com Spooky Couch - Albert Hammond Jr. Tudo o que consigo dizer sobre ela é que há um tom de misterioso em tudo. Spooky, como se o sofá de alguma maneira assustasse o observador. Mas a melodia me faz sentir muitas coisas, mas não assustado. Na verdade, admirado. E, no final, esperançoso. A esperança transmitida é tão forte que o meu desejo acaba sendo de que a música não acabe, no medo de que a sensação acabe com ela, o quê, infelizmente, ocorre. Integralmente instrumental, a música segue-se numa progressão feita em ritmo certo, como se, aos poucos, fossem desvendados os tão misteriosos segredos do "sofá".

E aí chegou I've Just Seen A Face. Não a versão dos Beatles, mas a produzida no musical Across The Universe, cantada por Jim Sturgess. Essa traduz nada mais nada menos do que o amor. A verdade é que ouvi-la me trouxe uma sensação nunca antes sentida: arrepios nos cabelos da nuca, descendo então para o resto do corpo. Magnífica sensação! Já li sobre ela em vários livros, mas senti-la é algo único. É música de casal, música para ser cantada sempre que possível para a parceira, mostrando o que ela é capaz de fazer comigo.

Mas mais ou menos na linha há também Outros Sonhos, de Chico Buarque. Utopia: é a palavra que me translata o sentimento de ouvir. E como não poderia ser ela? Tudo descrito em letra mostram coisas que a humanidade vê como objetivo, particularizado no cenário carioca, mas ainda assim universal. Para mim é visto como o poema perfeito, daqueles onde o autor escreve e o vê insuperável, se é que isso é possível, pois a sensação de insuperabilidade impediria de continuar escrevendo.

E, por fim, apesar de eu achar que ainda há outras músicas marcantíssimas, mas ser incapaz de lembrar, fica Battleships - Travis. Apaixonante. Não entendo, mas é essa palavra que surge ao pensar nela, no meu fluxo livre de imaginação. Não é em alguém específico que penso quando a ouço. Nem no fato de existir alguém, qualquer que seja. Diria que é mais... em mim mesmo. Fico embalado em sensações próprias, numa situação de felicidade extrema e transbordante ainda que plena, e mesmo que tudo na letra indique que tal sentimento utópico seja causado por uma pessoa amada. Como se por dentro tudo estivesse a explodir, mas só interiormente. E como se toda essa reação seja desencadeada de fato por um outro alguém, mas que o objeto de meu interesse seja só a reação em si.

E só para não deixar como se não houvesse interesse nenhum pela banda, tenho que falar de Los Hermanos. A verdade é que não consigo encontrar uma música favorita dentre a obra. Não vou dizer que todas são minhas favoritas: algumas me desagradam. Mas a maioria, sim. Diria que a obra deles fica para a vida toda. Não há uma música única. Não que todas sejam iguais; mas, no caso das acimas descritas, uma música aparece mais forte dentre outras. Com as deles, não: todas são fortes demais e aparecem em mesma proporção. Tudo bem que há muitas que se destacam. Mas, não entendo o porquê, escolher uma melhor entre elas é impossível. Não me sinto como se tivesse traindo as demais, e não estou enganando a mim mesmo, realmente não consigo eleger tal posto. Mas que fique registrado o meu interesse maior-mor pelo conjunto.

E outras virão. Que fique aqui a certeza.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Vai ver lá no fundo, bem escondido, intocável, está nós. Nossa essência, nosso ser: imutável.

E pra que mudar? assim a gente fica eterno; sem os outros, sem ninguém.

só a gente mesmo.
Que fiquem as dúvidas, pois as certezas serão jamais completas.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

A casa.

Era ali. Na verdade, ainda é, mas por pouco tempo. Os irmãos pararam para olhá-la, de fora, ao longe. Como uma última vista. Quantos anos haviam sido? Não lembravam, mas e daí?
-A gente pode entrar?
Podiam. E entraram. Como se esperava, estava tudo em pó. O do meio não resistiu: pôs-se a espirrar. A mais nova o amparava. Saíram assim, visitando cômodo por cômodo. O mais velho, no entanto, limitou-se à sala. Encarava um ponto fixo na parede acizentada pela poeira, descascada, que outrora era de um amarelo vivíssimo. Sentou-se ali.

Os outros dois saíram explorando. Foram primeiramente ao jardim. Jardim? Não, não; aquilo agora era selva. A grama alta, árvores crescidas sem restrições. A sombra que se tinha debaixo delas nunca havia sido tão fresca. Repousaram ali uns instantes.

O mais velho chamou. Disse para visitar os quartos no andar acima. Foram os três. A do meio apreciava o espaço entre os ladrilhos, acimentados. Recordara o fato de que, sempre que algum líquido era derramado, ele se acumulava por lá, peguento. Caminharam pelo corredor, olhando os quartos dos três de relance, só quando passavam pela porta de cada um. Havia adesivos colados, aos montes. Expressões de identidade.

Havia em todos os lugares a camada de sujeira, densa. Mas não ali. Não no último quarto, não no mais importante deles:
o quarto dos pais. Estava imaculado, como se nada houvesse mudado desde a ida. E não fora; cama, estante, criados-mudos, tapete, lençóis e travesseiros permaneciam ali, intactos. Não arrumados, organizados, mas como haviam sido deixados no dia em que os dois partiram. Nos criados-mudos jaziam fotos. Casamento, nascimento de cada filho, família reunida.

Não conseguiram segurar o choro os mais novos. O mais velho se manteve impassivo, como era desde a partida. As lembranças inundavam, e a saudade mais ainda. Os dois procuraram apoio no maior. Experiência. Abraço.

Deixaram o lugar. Uma última vista, de longe. O do meio viu o irmão como forte: decidiu parar de chorar. A caçula gritou "espera!" e saiu correndo rumo ao quarto novamente. Deixou ali uma mensagem escrita por ela, na esperança de que, quem sabe, os pais leriam. O conteúdo não deve ser comentado; há coisas que devem ser deixadas apenas entre os participam do contexto. Eu como observador não tenho direito de reconhecer o que foi escrito.

A decisão foi tomada pelos três. Faziam-se anos desde a ida dos pais, e desde então o quarto e a casa havia sido mantido como um santuário. Os pedidos de demolição eram inúmeros, mas também ignorados. Mas chega um momento em que se percebe que, por mais que se queira mantê-las próximas, é preciso deixar as pessoas partirem.

O sofrimento de tal decisão também era mútuo, mas o conhecimento do mesmo não era de todos. É verdade que os mais novos expunham suas emoções publicamente, mas o que não sabiam é que o mais velho era o que mais sofria entre eles. Chorava calado um choro baixo, escondido, oculto. Mas forte. A decisão por sua parte foi certamente a mais difícil.

Mantiveram-se longe, e não visitaram o local desde então. Para quê? Certamente haveria indícios de um novo edifício, ou apenas escombros.

A casa não sumiu. Nem se manteve. Na verdade, se multiplicou. Só agora ocupa lugares diferentes. Lugares que nem se comprova a existência. Só existe.
Intocável, sim. Para todos os demais.
Mas tão aconchegante, segura como sempre foi.
E completa.

domingo, 4 de janeiro de 2009

A fuga.

Me peguei lembrando de quando Luma tinha fugido. Faz-se tempo; ela, uma yorkshire pretinha, nem com dois anos, botou na cabeça que seguiria o meu irmão. E seguiu. mas foi assim, sorrateira. Acabou por ninguém conseguir percebê-la: nem ele, nem nós em casa. Quando nos demos conta, foi um estardalhaço. Na verdade não, foi aos poucos. A gradação da suspeita à certeza. Primeiro se procura em lugares prováveis, e depois de não se achar nem nos imporváveis vem a constatação:

É, fugiu. Segue-se então a ampliação da busca: da casa ao bairro. Fomos de carro até a avenida. Era, para nós, o máximo a que ela chegaria; ficava a 5 quarteirões de casa. Depois de buscas a olho, nada feito. Voltamos para casa e preparamos cartazes com fotos dela. Dizíamos que haveria recompensa: mainha estava disposta a pagar 300 reais por ela. Colamos cartazes, saímos perguntando em prédios vizinhos, demos até alguns para o jornaleiro colocar nos jornais...

...nada feito. Voltei pra casa arrasado. Mainha disse para Babi, a outra york, mais velha: "é, você agora vai poder ser rainha sozinha da casa". "Rainha ela sempre foi, mas antes havia uma princesinha", disse eu em minha cabeça. Chorei, escondido. No MSN, minha amiga me xingava; dizia que eu era idiota, foi burrice minha. Vai ver eu na minha fraqueza não pude retrucar, ou era fraco na época mesmo. Os outros que estavam na conversa o fizeram por mim.

Raiou então o outro dia. Acordei cedo, umas oito horas, mesmo tendo ido dormir às cinco. Disse à minha mãe que sairia para colar mais uns cartazes, e fui. Se não me engano, levei Babi junto. Fomos mais adiante, umas três quadras. Colei uns nos postes e então voltei para casa.

Não demorou muito. A ligação deve ter chegado umas duas horas depois. Gabriel, um morador das redondezas, havia achado-a desde ontem, e acolhido. Mainha gritava como nunca. "Gabriel, você é um anjo!", e foi por isso que até hoje me lembro o nome do homem. Ele explicou a história: disse que ela estava atrás de um pneu de um carro, no prédio onde ele morava. A empregada, que estava chegando para trabalhar, viu exatamente o último cartaz que eu colei, num poste próximo ao edifício.

Ao chegarmos lá, foi uma festa. Luma estava toda eufórica; eu e mainha, então... O casal falou que não queria recompensa, mas mainha insistiu em dar um conjunto de banho a eles. Falaram que havia acontecido o mesmo com a mãe de um dos dois, não lembro se de Gabriel ou da mulher, e disse que o havia achado cobrara dinheiro para devolver o cão.

Não sei se já deixei claro aqui antes, mas não acredito em coincidências. A história me lembrou de o quão sortudos fomos. O cartaz poderia ser posto em qualquer lugar. E se tivesse sido colado depois, quem sabe se o viriam? A hora e o local foram exatos.

Ou será que não foi sorte? Vai ver Luma era para ficar com a gente mesmo.
E ficou. Perdura até hoje.